Sobre quebra-cabeça
Aquilo que nos move é o mistério.
Pessoas são como quebra cabeças.
Há várias peças em seus variados formatos de cores distintas. A diferença do
jogo é que nunca sabemos qual imagem irá se formar depois que começamos a
encaixar as peças. O que é aproxima é que para se montar um quebra cabeça
precisamos dispor de tempo, cuidado, paciência e, sobretudo, observação; para
se conhecer alguém é preciso dessas mesmas coisas. Ao invés de peças,
encaixamos palavras.
Tem um cara desses que disse uma
vez, “penso, logo existo”, aprendi a algum tempo que existimos principalmente
por aquilo que não pensamos. A maioria das coisas que fazemos ou mesmo falamos
não exige de nós um tempo de reflexão sobre, atuamos na vida naturalmente, como
se tudo já estivesse marcado em nós. E está! Por outro lado, ainda existem
aqueles momentos que agimos de tal modo que não esperávamos aquilo que sai do que
é considerado nosso padrão, nessas ocasiões, sempre aquele que fala aquilo não era
ele, que estava fora de si. Isso é o mesmo que falar que um computador roda um
programa que não está instalado nele. Nada sabe sobre si, nunca leu Adélia
Prado : “ Tinha vantagens não saber do inconsciente, vinha tudo de fora, maus
pensamentos, sensações, desejos. Contudo ficar sabendo foi melhor, estou mais
densa, tenho âncora, paro em pé por mais tempo. De vez em quando ainda fico
oca, o corpo hostil e Deus bravo. Passa logo. Como um pato sabe nadar sem
saber, sei sabendo que, se for preciso, na hora H nado com desenvoltura. Guardo
sabedoria no almoxarifado.”. Nossa vida vem de dentro: sentimentos, gestos,
palavras. Tudo o que sai da gente nos pertence a primeiro momento. Entretanto,
quando mostramos isso a alguém deixa de pertencer a uma pessoa apenas, para a
ser algo compartilhado, do eu para o nosso. Acredito que foi pensando nisso que
o pequeno príncipe disse que somos eternamente responsáveis por aquilo que
cativamos.

Embora nenhum quebra-cabeça-gente seja definitivo,
se pode saber de alguns. Aqueles que com uma ou duas palavras já sabemos
exatamente que imagem irá se formar. Outro, no início fica algo difícil de
entender como se monta, mas com um pouco de tempo, a imagem fica clara e
nítida. Existem ainda aqueles que são tudo tão confuso que nem perdemos nosso
tempo para montar. Porém, ainda existe aquele que não temos a mínima ideia de
como montar, as peças parecem não fazer sentido algum, ficam soltas, mas com um
pouco de cuidado, vai se entendendo como as peças de encaixam, a imagem aparece
aos poucos. E quanto mais peças montamos, mais queremos montar. A imagem ganha
mais nitidez, melhor, a imagem ganha significado, entretanto, não um
significado de fim, mas um desejo (todo aquilo que tem significado para nós tem
um pouco de nosso desejo, mas isso fica para uma outra conversa) de
continuidade, porque a cada nova peça (palavra), por ser inesperada, se torna
surpreendente, consegue-se ver a ancora, caminhar pela ponte e se sentir
responsável pelo cuidado pela imagem.
Ainda falta falar sobre uma coisa
sobre essas peças, essas palavras. Toda palavra tem seu som, toda poesia tem
sua música.
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